Com as notícias sobre a alteração ao acesso ao ensino superior convém perceber do que estamos a falar e do que precisamos efetivamente. Desde logo convém ter em mente que os açorianos têm uma discriminação positiva através de uma «quota».
Como tem funcionado o acesso: os alunos chegam ao final do 12 e submetem numa plataforma digital um código que contém a informação da média do secundário e dos resultados de cada exame nacional que realizou. O estudante coloca por ordem até seis opções de cursos que pretende frequentar. Tendo em conta o peso relativo exames/média que cada curso pede, para cada opção existe uma nota associada. Os estudantes vão sendo ordenados tendo em conta esses valores sendo distribuídos pelas vagas dos cursos. Há aqui um passo intermédio que é pertinente abordar: enquanto está a fazer a candidatura, o aluno pode usar a preferência regional e contingentes. Quando o candidato pretende ficar na sua área de residência, pode ativar a preferência regional, colocando obrigatoriamente em primeiros lugares as opções nessa área. Para certas categorias demográficas existem umas «quotas»: os contingentes. É aqui que se vai basear a nossa discussão. Cada curso dispõe de uma percentagem de vagas para estudantes açorianos (tal como um x para madeirenses, y para militares e z para pessoas portadoras de deficiência). Assim sendo, um estudante açoriano pode optar por concorrer com contingente e, nesse caso, irá concorrer só com açorianos para ter aquelas n vagas – há regras: se o curso em questão existir na Universidade dos Açores, esta opção tem de estar em primeiro lugar.
Ora, com o anúncio de algumas alterações ao acesso ao ensino superior, tem-se em mira diminuir a percentagem de vagas do contingente açoriano, passando de 3,5% para 2%. Fará isto sentido? Fará sentido, desde logo, o contingente?
O contingente é um mecanismo para garantir a presença de um grupo demográfico no curso. Se a um curso, pelo menos, um açoriano se candidata e usa o contingente, então esse curso receberá, pelo menos, um açoriano. Há, claramente, uma discriminação positiva. Temos de ter em mente que a Academia açoriana não consegue oferecer toda a variedade de cursos que existem e podem ser encontrados no continente. Pelo princípio da coesão territorial fará sentido a existência deste contingente. Mas pergunto-me se o foco deste raciocínio não estará mal colocado. O problema dos estudantes açorianos para frequentarem o ensino superior no continente está em conseguir ser colocado ou nos custos extra? O problema são as notas ou as despesas de alojamento e viagens?
O contingente terá sido criado num contexto muito diferente do nosso. Temos um sistema regional de ensino, mas submetido aos objetivos programáticos nacionais. Qualquer aluno açoriano está, hoje, em pé de igualdade com alguém que fez o seu ensino no continente. Não existe uma desigualdade de oportunidades como já houve. Continuar a afirmar a necessidade de os açorianos precisarem de um empurrão nas notas é alimentar um estigma.
Hoje é habitual ver nestes contingentes alunos com notas inferiores ao último colocado do geral. Não porque os açorianos não conseguem melhor, mas porque se trata de um número muito reduzido de candidatos. Não quero com isto dizer que alunos com notas mais baixas não possam ter sucesso (atribuir mais peso aos exames nacionais demonstrarão alguma razão nisto, visto o seu caráter mais específico).
Os açorianos não estão em situação de desigualdade, pessoas com carências económicas sim.