A pobreza nos Açores e as refeições escolares

Os mais recentes dados sobre o risco de pobreza e a desigualdade publicados pelo INE levantam questões que não podem deixar de ser feitas e que colocam, a meu ver, em causa o modelo de desenvolvimento que seguimos nos Açores e que o atual governo de direita aprofunda.

Depois de, no ano passado, os dados referentes a 2020 denotarem uma melhoria no indicador de população em risco de pobreza, os resultados de 2021 trouxeram péssimas notícias, a juntar a um contexto já de si muito negro por via do aumento brutal do custo de vida e das taxas de juro. 

A população em risco de pobreza cresceu mais de 3,2 pontos percentuais, atingindo os 25%. Foi nos Açores que este indicador mais cresceu, seguido da Madeira e do Algarve. 

Este dado é já após as transferências sociais, que incluem pensões e apoios sociais, como subsídio de desemprego, abono de famílias, entre outros apoios. Significa isso que, mesmo com apoios sociais, ¼ da população estava em risco de pobreza.

Ora, em 2021 os Açores apresentaram uma taxa de desemprego de 7,2% que, apesar de ter sido a mais elevada do país, não difere muito da taxa de 2020 (6,1%). Não é difícil concluir que uma taxa de desemprego relativamente baixa não foi suficiente para impedir o aumento da pobreza na região. Se mesmo com emprego muita gente está em risco de pobreza (os dados do INE assim o confirmam) então quer dizer que muito do emprego e salário é manifestamente insuficiente para retirar as pessoas desse patamar.

A vantagem de termos dados estatísticos é corrigirmos o caminho. Em primeiro lugar, percebendo que não é contra a estatística que devemos lutar, mas sim lendo-as e acertando o passo às políticas. Os apoios sociais que a direita vilipendia, apelidando quem os recebe de “subsidiodependentes” são fundamentais para mitigar os efeitos da pobreza. Parece que agora o reconhecem, ou dá jeito reconhecer para tentar justificar o injustificável. 

Mas a pobreza e a desigualdade não são uma inevitabilidade ou um fado das relações sociais. São resultado de escolhas políticas. Quando se baseia uma economia na exploração da mão- de- obra barata o resultado é pobreza e desigualdade. 

Para mitigar os efeitos da pobreza que abrange partes da população potencialmente fora do alcance dos apoios sociais em vigor é necessário criar novas respostas e universalizar respostas já existentes. 

Desde 2014 que, por proposta do Bloco de Esquerda, são fornecidas refeições escolares as férias. No entanto, essa medida abrange apenas as famílias no I e II escalação da ação social escolar. Isso significa que mais de 60% das crianças não têm acesso a esta medida mesmo que dela necessitem. E no atual contexto é mais do que óbvio que haverá mais crianças a necessitar dessa resposta.

É preciso ir mais além. Alargar essa mesma medida a todos os alunos que efetivamente necessitam, independentemente do escalão, é garantir que nenhuma criança fica sem uma refeição quente e equilibrada durante a interrupção letiva. Esse é o objetivo de uma proposta agora apresentada pelo Bloco no parlamento dos Açores.

A escola pública é um pilar da igualdade. Na escola pública todos são iguais e ninguém é discriminado pela sua condição socioeconómica. Na escola pública todos os alunos têm acesso aos mesmos recursos (ou deviam ter). No que respeita às refeições escolares, todos os alunos têm acesso às refeições fornecidas pela escola durante as aulas. Não há motivo para não acontecer o mesmo durante interrupções letivas.