Acordo Transatlântico: o protecionismo aos grandes investidores

Os partidos do arco da governabilidade têm sido irresponsáveis por abraçarem e difundirem aquilo que 'vendem', por omissão ou por glorificação, como um dos futuros impulsionadores da economia europeia, nacional e regional. Refiro-me ao Acordo Transatlântico.

Este será, se os povos europeus (e já agora norte-americanos) não se rebelarem, um Acordo ou Tratado transnacional que somente servirá os interesses comerciais das grandes multinacionais, muito à semelhança do NAFTA, um outro acordo de comércio que explorou a livre circulação de capitais (não necessariamente de pessoas) entre os E.U.A, México e Canadá. Tão semelhante, que também foi anunciado, inicialmente, como o milagre que permitiria retirar as economias norte-americanas do marasmo. De facto, multiplicou por três vezes e meia o comércio na América do Norte, mas destruiu emprego, não só diretamente, através do desemprego, mas também através do embaratecimento da mão-de-obra e contribuiu para a estagnação salarial que se fez sentir, a partir da década de 70, nos Estados Unidos. Enfim, consolidou o fim do «sonho americano».

Não tenhamos dúvidas de que este Acordo Transatlântico não trará para os Açores qualquer papel de centralidade, como se a nossa localização entre a Europa e o continente norte-americano fosse suficiente para tal. Antes pelo contrário, a centralidade, neste Acordo, será ocupada pelas grandes multinacionais que terão à sua disposição mais um instrumento para subjugar os países.

Se este Acordo Transatlântico, que está a ser delineado, em segredo, com a Comissão Europeia (órgão europeu não eleito), incluir algo semelhante a um Centro Internacional de Resolução de Diferendos sobre Investimentos (uma estrutura do Banco Mundial), legitimado pela demissão dos Estados relativamente à sua função reguladora, então teremos um Acordo liberal, naquilo que é a sua essência mais paradoxal, pois é protecionista dos grandes investidores e contra qualquer lei, regulação ou norma estabelecida pelos Estados. No concreto, está em causa a possibilidade de uma multinacional reivindicar uma compensação ou um acordo, sempre que alegue que os seus interesses estão a ser prejudicados, por via de qualquer regulação ambiental, de proteção do consumidor, dos trabalhadores e proteção social de produção, como por exemplo, as quotas leiteiras e medidas compensatórias como o POSEI. Por isso, é impossível alguém ser a favor das quotas leiteiras e do POSEI e ser, simultaneamente, a favor do Acordo Transatlântico.

Com a adoção do Acordo Transatlântico não será possível termos pequenos produtores que, ao aproveitarem medidas protecionistas, consigam disponibilizar produtos e serviços com valor acrescentado que os diferenciem, em termos qualitativos, no mercado interno e externo. Pelo contrário, o nosso mercado regional e local será 'inundado' de produtos importados, baratos (devido à exploração de mão-de-obra em outras zonas do globo), mas com pouco ou sem qualquer valor acrescentado. Os poucos produtores regionais e locais que restarem serão empurrados para um modelo que imite a exploração de mão-de-obra, sobretudo, a não-qualificada ou serão adquiridos por grandes multinacionais que os explorarão.

Em suma, se os Açores ocupam um espaço central neste futuro Acordo Transatlântico, só se for o de papel de «galinha» que está no centro de uma capoeira com um «lobo» à solta.