O planeamento integrado dos transportes, nos Açores, é atamancado ou mesmo inexistente, as soluções apontadas parecem fáceis, consensuais, populistas, plenas de oportunismo e viciam o debate sobre os transportes aéreos.
Tudo se resume a um problema que aflige os açorianos. É caro sair de qualquer uma das nossas ilhas, sendo ainda mais caro, no caso do transporte inter-ilhas.
O problema também se estende ao custo do transporte de mercadorias e não só, no que diz respeito ao custo direto, mas também ao custo indireto, associado aos horários e disponibilidade de voos que não se coadunam com a natureza do que é transportado e a necessidade do cliente final. Mais um sintoma do deficiente ou ausente planeamento dos transportes na Região.
Quem defende, sem reservas, que as companhias aéreas low-cost operem em todas as rotas de serviço público, e entenda-se que esse conceito não se limita a viagens entre São Miguel e continente, está de acordo que a Região lhes pague um incentivo. Sim. Porque não terão interesse comercial na Região, se não forem devidamente compensadas. Além dessa compensação, que garantia teremos que as viagens serão mais baratas? Considerando que as tarifas 'low cost' dependem das flutuações da procura e do peso da bagagem do porão, para não referir as limitações restritas, em termos de peso e até mesmo da dimensão da bagagem de mão.
Convém, igualmente, não esquecer que as companhias aéreas 'low cost', ao contrário da SATA, não vão adiantar o valor do subsídio por bilhete, pelo que o cliente terá de adiantar o preço total da tarifa e só depois, sabe-se lá quando, receberá o respetivo subsídio.
Depositar todas as esperanças do futuro dos transportes aéreos, nos Açores, nas companhias aéreas 'low cost' e numa SATA privatizada é contribuir para um modelo de transportes centralizado, acentuador do desenvolvimento regional desarmonioso e insustentável, pois só haverá interesse na exploração de mercados, minimamente, viáveis. Por outras palavras, voar para outras ilhas, que não São Miguel, não será, financeiramente, viável, o que aumentará a desertificação das ilhas de coesão, sem esquecermos que os aeródromos das ilhas do Pico, Graciosa, Corvo, São Jorge e a aerogare das Flores são geridos pela SATA, numa perspetiva de serviço público e que essa perspetiva será, no mínimo descuidada, numa futura SATA privatizada que procurará o lucro.
O modelo de turismo que ambicionamos para a Região será o espelho do modelo de transportes aéreos que tivermos. Para um modelo baseado em voos 'low cost' teremos turismo 'low spend'. Um turismo de massas que nunca será de massas e ficará condenado a um limbo eterno entre a nossa realidade, apreciada por nichos de mercado, e uma estratégia direcionada para o turismo de praias tropicais que, nos Açores, só existe na imaginação de alguns.
A SATA é cada vez mais apetecível à privatização, à medida que não investe no quadro de pessoal e reduz os seus custos, numa manobra maquiavélica, em que o poder reivindicativo dos trabalhadores é deturpado pelo seu único acionista que, afinal, não paga sempre com gosto e tem assumido uma postura sádica ao assistir, de camarote, à condenação pública dos grevistas, preparando-se agora para os castigar, após a greve, com uma reestruturação.
Mais uma vez, temos um Partido Socialista que ameaça os grevistas e está com o representante dos patrões, o mesmo que, há relativamente pouco tempo, reivindicou a redução de pessoal na SATA como consequência dos prejuízos decorrentes da greve. Paradoxalmente, ao lado de um patrão que já sugou a Região e prejudicou trabalhadores, para jogar numa roleta que nem existe.
É óbvio que a política de transportes da Região vai além da SATA, não só porque dever-se-ão considerar outros meios de transportes, a sua concertação, assim como o nosso potencial geo-estratégico para a aviação comercial.
É reconhecido que o espaço aéreo europeu está sobrecarregado. Um problema europeu que pode ser uma oportunidade para os Açores que tem uma localização privilegiada, entre o continente europeu e o continente americano, e uma infraestrutura que seria, facilmente, convertida para uma utilização civil e que serviria de base de manutenção à aviação comercial, permitindo dessa forma, aliviar o espaço aéreo europeu. Refiro-me à Base das Lajes. Contudo, a utilização militar e belicista, mesmo que adormecida ou em part-time, não é compatível com as exigências da aviação civil. Aliás, bem conhecemos as limitações e condicionalismos da aviação comercial na utilização da pista da base da Lajes, devido a exigências militares.
É tempo de assumirmos que a utilização militar da base das Lajes é uma barreira ao desenvolvimento dos Açores e da ilha Terceira, pois impede o aproveitamento que poderia ser feito da nossa posição geo-estratégica, em vez de facilitar.
Enfim, devemos, não só, ter uma política integrada de transportes, mas também podemos ser estratégicos para a política europeia de transportes, prova de que vivemos no Atlântico Norte e nos 38 graus de latitude.