Agora este!

A promulgação do Decreto Lei 117/2024 a 30 de Dezembro, que altera o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, vulgo “lei dos solos”, um novo instrumento legislativo fundado num sistema simplificado de vontade política, assumido pela Assembleia Municipal, sem alteração do respetivo PDM, na sua aplicação vem possibilitar a construção em solo rústico, pretensamente como resolução do problema da habitação, mas em prejuízo da agricultura, da floresta, do ambiente e do próprio tecido urbano.

Invocando a necessidade de solos urbanos para habitação, abre portas à especulação imobiliária, de forte componente turística, quando na realidade e de forma generalizada, não existe carência de solos urbanos ou urbanizáveis, que não constituam resposta à falta de habitação, que garantam a adequada urbanização, configurada no respetivo PDM. Para a Região, já sob enorme pressão sobre as orlas costeiras, este novo documento legislativo, abre as portas à especulação dos solos agrícolas e florestais, garantidamente conseguindo a sua descaracterização ambiental e urbana, com os inerentes prejuízos, pelo que se torna imperiosa a sua não aplicação, porquanto não necessária na resolução do problema da habitação, quando as atuais áreas urbanas e urbanizáveis são sobejamente suficientes para o efeito, e quando além do mais, todas as ilhas vêm perdendo população.

Pese o alerta, do Senhor Secretário Regional dos Assuntos Parlamentares e das Comunidades, pronto a fiscalizar eventuais e destemperadas aplicações daquele documento, sem meios para o fazer, por a lei não o prever, salvo qualquer denúncia, importa a leitura dos diferentes PDM’s, procurando salvaguardar tentações dos diferentes diabos que nos assistem, e que aqui, iniciamos: - Vila Nova do Corvo O PDM assume duas Unidades Operativas de Planeamento e Gestão (UOPG) destinadas a habitação, sendo uma correspondente à “Zona Classificada da Vila Nova do Corvo”, área consolidada, onde existem ainda numerosos fogos por reabilitar, capazes de garantirem eventuais carências. A segunda UOPG, com uma área de cerca de 50% da anterior, área a consolidar, também destinada a habitação, onde se vêm construindo as novas habitações, que ainda carece da sua consolidação, porquanto também capaz de dar resposta. À perda de cerca de 10% da população (Censos 2011/2021), corresponde um aumento de cerca de 6% dos alojamentos, aparentemente supridores da pressão turística. O PDM, ainda nos diz, ainda que já não garanta, que: “Não são permitidas operações urbanísticas...que possam causar prejuízo a valores ambientais ou a enquadramentos arquitetónicos, urbanísticos ou paisagistas relevantes.” - Santa Cruz das Flores Apresenta um conjunto de áreas urbanizáveis equivalente em área ao solo urbano, configurando a duplicação da urbanização quando na área urbana existem ainda espaços intersticiais capazes de acolher novas construções, bem como outros capazes de reconversão para o efeito, se fora caso disso. - Lajes das Flores Como áreas urbanizáveis dispõe de cerca de um terço da área de solo urbano, a que acresce a área da Fajã Grande, que aí duplica a respetiva área urbana. Também a ilha das Flores tem vindo a perder população, cerca de 10%, ainda que registe no mesmo período 2011/2021 um aumento de habitações, que tal como no Corvo, e com maior expressão na Fajã Grande, corresponderão a segundas habitações ou a alojamentos turísticos.

No Corvo e Flores, duas ilhas da Reserva da Biosfera, o suposto “Problema da Habitação”, na existência de áreas urbanizáveis em dimensão suficiente, capazes de o suprir, não admite qualquer justificação à aplicação da lei, desrespeitadora do ordenamento do território.