Tudo à grande

 

A ilha Terceira e Angra do Heroísmo não podem continuar a seguir uma espécie de modelo de desenvolvimento ‘bairrista’, segundo o qual, tudo o que se faz em São Miguel, e esporadicamente, em outras ilhas, deverá ser reproduzido por cá, assim como tudo o que se faz na Praia da Vitória terá de ser feito em Angra do Heroísmo. Foi assim, que as ‘forças vivas’ de Angra reivindicaram uma marina para a nossa baía, só porque construíram uma na Praia, a qual, por sua vez, só foi construída, porque a cidade da Horta também possuía uma.

Era, sem dúvida, urgente reabilitar a via-rápida ‘Vitorino Nemésio’, mas não resistiram à tentação de aproveitar a obra, para enterrar mais uns tantos milhões, no seu alargamento, sem que o movimento rodoviário o justificasse. Por outro lado, poder-se-ia ter feito um maior investimento no emparcelamento dos terrenos agrícolas, em detrimento da construção de uns quantos ‘vacodutos’. Todavia, mais uma vez, imperou a mania das ‘grandezas’.

Há, sensivelmente, duas décadas, faltava oferta hoteleira convencional e de cariz rural/habitação, na ilha. Agora, depois de termos assistido ao encerramento e abandono de um hotel 5 estrelas, nas Sete Cidades, em São Miguel, construímos hotéis, atrás de hotéis. Porque seria um sinal de desenvolvimento e porque, se São Miguel tem, nós também teríamos de ter. Paradoxalmente, apesar do esforço de alguns empresários no investimento em unidades de turismo rural/habitação, sentimos que, na prática, o poder instituído só acredita em hotéis de 4 e 5 estrelas, assim como, mesmo quando proclamam as virtudes de um modelo baseado no turismo natureza, na prática o investimento é direcionado para os campos de golf e casinos, mesmo com os resultados desastrosos obtidos.

Mais uma vez, faz-se a cabeça dos angrenses, tal como o fizeram para instalar a marina e nem mudam de técnica, para as supostas virtuosidades de um cais de cruzeiros a ser construído em Angra, no Porto das Pipas, só alteram o alvo da comparação, pois desta vez, é Ponta Delgada.

São poucos os que apresentam reservas, perante um projeto que não considera um plano integrado de transportes, fundamental para termos, finalmente, alguma racionalidade na forma como se complementam os transportes marítimos, aéreos e terrestres e sem contemplar uma previsão das implicações económicas para a cidade, o concelho e para a ilha.

Convém não esquecer que o turista de cruzeiro não gasta em hotelaria (convencional ou rural/habitação) e muito provavelmente pouco gastará na restauração e no comércio local, pois já dispõe de oferta, mais do que suficiente, a bordo. Por isso, é aconselhável, no mínimo, alguma ponderação quando se decide investir milhões.

Destruir um parque arqueológico subaquático para construir um porto de cruzeiros é dar cabo de um recurso emblemático do nosso património cultural e histórico, um fator de diferenciação que torna única, a cidade de Angra do Heroísmo, não só, na Região como no país.

O ‘bairrismo’ gerador de competição, só é proveitoso, se a ilha Terceira e o concelho de Angra do Heroísmo conseguirem aproveitar, as características que os tornam únicos para se distinguirem das restantes ilhas, caso contrário, corremos o risco de vivermos numa Região, constituída por nove ilhas, em que uma delas é uma espécie de mini-metrópole e a outra, uma espécie de micro-metrópole.

Cabe aos terceirenses e aos angrenses resistirem à tentação de enveredarem por um modelo de desenvolvimento ‘bairrista’ ou por um modelo de desenvolvimento ponderado e que considere as gerações vindouras.