A propósito do “Dia Internacional da Mulher” venho aqui, não distribuir flores ou vales de unhas de gel e massagens, mas falar de algo que muitos conhecem mas ninguém ousa falar na comunicação social que é sobre a violência processual que é exercida sobre as mulheres no sistema judicial português.
A violência processual contra as mulheres é mais uma forma de abuso que ocorre durante processos judiciais, incluindo divórcios, regulações de responsabilidades parentais, casos de violência doméstica, assédio sexual e outras questões relacionadas a direitos humanos das mulheres.
O conceito não é novo em outros sistemas jurídicos mais evoluídos, que além do debate na sociedade civil já transpuseram para a lei de forma a coibir os agressores (por norma homens) a utilizarem mais uma forma de violência contra as suas vítimas (por norma mulheres e filhos). Mas em Portugal esta “nova” velha forma de violência contra as mulheres existe, e é cada vez mais um recurso de enxovalhar, intimidar, coagir, humilhar, difamar e outras táticas que visam desacreditar e prejudicar as mulheres envolvidas nos processos judiciais.
Podemos compreender como violência processual: (i) a exposição desnecessária da vida privada da mulher no processo; (ii) a apresentação caricata da mulher no processo; (iii) a demonização da figura materna e a supervalorização das ações paternas (principalmente quando se trata de um processo de família); (iv) a utilização do/a filho/a comum do ex-casal como ferramenta de violência processual (pedidos descabidos de guarda unilateral, falsas alegações de "alienação" parental, mitigação do dever alimentar de forma fraudulenta, etc.); (v) a utilização de estereótipos de género contra a mulher e a favor do homem; (vi) a interposição de diversos recursos infindáveis, tumulto processual, impossibilidade e obstaculização da tramitação dos processos de forma propositada; (vii) o incumprimento de decisão judicial; (viii) o prolongamento desnecessário do processo; entre diversas outras situações que acontecem dentro do processo ou que o processo é utilizado como meio para violentar a mulher a partir do seu género e seus estereótipos.
As causas da violência processual são variadas, mas frequentemente estão relacionadas a preconceitos de género e desigualdade de poder. Em muitos sistemas judiciais, os profissionais do direito (advogados, juízes, procuradores) são predominantemente homens e têm uma visão estereotipada das mulheres como inferiores, emocionalmente instáveis ou mentirosas mantendo um espaço onde a violência de género é permitida e muitas vezes não percebida e ignorada.
Os efeitos da violência processual podem ser devastadores para as mulheres. Além de enfrentarem a dor emocional e psicológica causada pelo abuso, muitas mulheres também sofrem consequências financeiras e legais negativas. A violência processual também pode ser um fator que impede as mulheres de procurar a justiça em situações de violência doméstica ou assédio sexual, por saberem do calvário que é a passagem por um processo desta natureza. É um processo desgastante emocional e financeiramente, por ser demasiado longo.
Para combater a violência processual contra as mulheres, é necessária uma abordagem multifacetada. Em primeiro lugar, é importante que as leis sejam atualizadas para reconhecer a violência processual como uma forma de abuso e para impor sanções mais rigorosas aos responsáveis por essa violência. Também é importante que os profissionais do direito passem por formações sobre preconceito de género e como evitá-lo durante o processo judicial. As organizações de direitos humanos das mulheres podem oferecer apoio emocional e jurídico às mulheres que enfrentam abuso processual e trabalhar para sensibilizar a sociedade para este problema. Além disso, é importante que as mulheres sejam capacitadas com conhecimentos e recursos para que possam se proteger e defender os seus direitos em situações de violência processual.
É importante que a sociedade como um todo reconheça a gravidade da violência processual contra as mulheres e trabalhe em conjunto para erradicá-la, garantindo que todas as mulheres possam procurar a justiça e igualdade perante a lei, sem medo de sofrer abusos e preconceitos durante o processo judicial.